
A ortorexia nervosa não é reconhecida oficialmente como um transtorno alimentar (TA) e ainda existem poucas publicações sobre o tema na literatura científica. No entanto, a discussão sobre quando o comportamento alimentar se torna “obsessivamente saudável” deverá aumentar nos próximos anos, sendo de interesse para profissionais de saúde que trabalham com a promoção de hábitos alimentares saudáveis3.
As características observadas em indivíduos com ortorexia nervosa incluem a preocupação exagerada com a escolha dos alimentos e com a pureza da dieta, que deve ser livre de agrotóxicos, corantes, conservantes, ingredientes geneticamente modificados e excesso de gorduras saturadas, sal e açúcar. Também podem fazer parte do ritual obsessivo o modo de preparo dos alimentos (ex: somente hortaliças cortadas de determinada maneira) e os utensílios utilizados (ex: somente cerâmica, madeira, etc). Neste contexto, a alimentação passa a ser a preocupação central do dia a dia, para a qual o indivíduo dedica cada vez mais tempo1,2,3.
Os aspectos da personalidade das pessoas mais vulneráveis à ortorexia podem, segundo Bartrina (2007)1, ser semelhantes àqueles observados na anorexia nervosa. São, em geral, pessoas meticulosas, perfeccionistas, organizadas, com uma necessidade exagerada de autocuidado e proteção. Porém, diferente da anorexia nervosa, cuja ideologia é focada na perda de peso, a ortorexia busca alcançar a “dieta saudável perfeita”. Nesse sentido, o comportamento ortoréxico traz a criação de regras rígidas e a sensação de superioridade e desprezo em relação às pessoas que não adotam as mesmas normas em sua alimentação e estilo de vida3.
O diagnóstico pode ser feito por meio de um instrumento validado por pesquisadores italianos, intitulado ORTO-15. Este contém questões de múltipla escolha abordando atitudes obsessivas relacionadas à escolha, aquisição, preparo e consumo de alimentos considerados saudáveis4. A partir desta ferramenta, estudos internacionais sugerem que estudantes de medicina, médicos, nutricionistas, pessoas com sintomas de ansiedade e que supervalorizam o corpo perfeito constituem grupos suscetíveis ao desenvolvimento da ortorexia nervosa3.
No Brasil, o tema foi estudado por Alvarenga et al. (2012)5, que investigaram o comportamento ortoréxico em uma amostra de 392 nutricionistas que responderam ao teste ORTO-15 online, em versão em português. Foi possível observar uma tendência ao comportamento ortoréxico, em aspectos como a escolha de alimentos relacionada à qualidade nutricional ao invés do sabor, a crença de que alimentos saudáveis podem melhorar a aparência física e a rejeição de escolhas alimentares consideradas como transgressões. Mas, novas investigações são necessárias para confirmar a validade e confiabilidade do instrumento traduzido para uso em nossa população1, a fim de conhecer a prevalência da ortorexia.
O tratamento da ortorexia requer a participação de equipe multidisciplinar, composta por médicos, psicólogos e nutricionistas especializados. Tão importante quanto é o debate entre profissionais de saúde e toda a sociedade sobre o que significa a “alimentação saudável”, que não deve ser vista apenas do ponto de vista biológico, classificando alimentos em “bons”ou “ruins”, “saudáveis” ou “não saudáveis”, e sim em sua totalidade que engloba aspectos sociais, culturais, religiosos, entre outros3.
Referências:
1) Bartrina JA. Ortorexia o la obsesión por la dieta saludable. Archivos Latinoamericanos de Nutrición 2007; 57(4): 313-315.
2) Bratman S, Knight D. Health Food Junkies: Orthorexia Nervosa: Overcoming the Obsession with Healthful Eating. New York: Broadway Publisher; 2001.
3) Martins MCT, Alvarenga MS, Vargas SVA, et al. Ortorexia nervosa: reflexões sobre um novo conceito. Rev Nutr 2011; 24(2): 345-357.
4) Donini LM, Marsili D, Graziani MP, et al. Orthorexia nervosa: validation of a diagnosis questionnaire. Eat Weight Disord. 2005; 10(2):e28-e32.
5) Alvarenga MS, Martins MC, Sato KS, et al. Orthorexia nervosa behavior in a sample of Brazilian dietitians assessed by the Portuguese version of ORTO-15. Eat Weight Disord 2012; 17(1): e29-35.
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